O meu avô é um homem à antiga: um chefe de família, de valores nem sempre correctos mas firmes, imutáveis ao longo dos anos. Três antiquissimos relógios de corda constituem o seu mais precioso tesouro, que decidiu doar aos seus filhos Homens.
Teve três filhas: Graça, Anabella, e Maria, por ordem cronológica.
Falhado o plano A, o meu avô decidiu que havia de doar os seus preciosíssimos relógios aos netos Homens.
Quando soube que a filha mais velha estava grávida, prescrutou a sua reserva em busca de uma garrafa de um Whisky excelente e quase tão antigo quanto os seus relógios, para que fosse aberta se se desse o nascimento do tão aguardado primogénito.
Nasceu a primeira neta, Ana.
O meu avô não se deixou abater: tornou a guardar a garrafa, decidido a abri-la apenas quando nascesse um rapaz.
Quatro anos mais tarde, a sua segunda filha engravidou.
Novamente, o homem encheu-se de esperanças...
...e novamente, nasceu uma menina, Marta.
Mas ele não desistiu! A filha mais nova engravidara pouco depois de Anabella, e, se tudo corresse bem, Maria teria a criança seis meses depois da irmã.
Assim, o meu avô tornou a guardar a garrafa.
Nasci eu, Carolina.
O meu avô deve ter ficado francamente preocupado: três filhas, três netas... e homens, alguém que desse continuidade ao seu nome, nem vê-los!
Tornar a guardar a garrafa fechada deve ter sido uma cerimónia lúgubre e desmoralizante.
Porém, nem um ano passara e Maria tornara a engravidar e a dar à luz: nasceu Tomás, o tão esperado neto!
Louco de alegria, o meu avô finalmente abriu a garrafa!...
O Whisky estava estragado.
Bem feita. Espero que o relógio também se estrague.
Sem comentários:
Enviar um comentário