domingo, 28 de agosto de 2011

R.I.P. , por favor!

Já passou tanto tempo que me espanta que alguém seja capaz de descobrir o local onde tudo foi enterrado. Afinal, tratei de calcar e recalcar a terra recalcada, depois de o enterrar o mais profundamente possível.
O lugar mudou muito desde então: cresceram plantas, rolaram pedras... Está completamente diferente. Eu própria já não o conseguiria encontrar.
Todavia, houve alguém que o fez: o meu antigo companheiro traiu-me, decerto, e indicou-lhe o local de descanso daquele pobre diabo. Tenho que admitir que não esperava que ele se lembrasse.
A sepultura foi aberta, e um saco de plástico preto daqueles para o lixo, foi de lá tirado, todo sujo de terra. Estava inesperadamente leve.
Antes, talvez me indignasse pela profanação daquele lugar aonde só eu e ele deveríamos ter acesso, mas agora não me importei.
O saco foi aberto, e imagino que a intrusa tenha ficado surpreendida, e mesmo incrédula, ao descobri-lo vazio. Já nem sequer havia um cadáver podre e mal-cheiroso lá dentro: só algum pó, que se confundia com a terra que conseguira penetrar no saco. Ali já não se encontravam nem mesmo vermes.
Não sei se estará aliviada ou irritada, ou se desconfiará das coordenadas que lhe foram dadas.
Seja como for, não me diz respeito e não me importa.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Abençoado o trabalho, que nos vale o nosso dinheiro. E abençoado o dinheiro, que compra o nosso pão. E abençoado o pão, que mantém vivos os nossos corpos.

Maldito o trabalho que consome dia após dia os preciosos dias da nossa vida! E maldito o dinheiro, que nunca chega para mais do que o suficiente! E maldito o pão, que nos permite sobreviver sem que nunca saibamos se um dia iremos ou não viver!
Porque hão-de o esforço e o sacrificio ser tão valorizados? Porque havemos de sentir gratidão e não ambição quando damos tanto e recebemos tão pouco? Porque havemos de nos saciar com comida quando temos fome de outras coisas?!
Sinto profundamente a falta de uma vida mais simples: aquela em que matávamos para comer e bebíamos porque tinhamos sede. Uma vida orientada pelas nossas necessidades e sentimentos, uma vida em que soubéssemos para que estávamos a lutar e que no fim do dia fizesse sentido.
Uma vida com tempo...
Tempo.
Não tenho tempo para nada. Nunca chego a trabalhar tanto quanto devia, mas também não descanso tanto quanto preciso...

Mas não passa de uma utopia, eu sei, eu sei... Não existe em lugar algum semelhante paraíso.
Resta-nos imaginá-lo.