quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O Paraíso

Hoje enquanto viajávamos de metro, eu, a Catarina e a Leonor recordamos o que pensávamos acerca do Paraíso quando éramos pequenas.
Catarina deve ter ouvido alguma vez dizer que "os corações bons iam para o céu"... Pelo que imaginou um bando de corações alados a voar sobre as nuvens.
Mas eram todos iguais uns aos outros, pelo que ninguém se reconhecia e eram muito infelizes.
Catarina achava isto tão triste que chegava a chorar.
Leonor apenas nos disse que todas as noites rezava para que os pais fossem para o céu, o que aos meus ouvidos soou um bocado mal: parecia que desejava que morressem!
Eu achava que o céu ate devia ser bom, porque segundo a minha mãe quando as pessoas iam para la voltavam a ficar novas e bonitas, alem de que se podia voar.
So ficava as vezes preocupada a pensar se não seria aborrecido, porque só havia nuvens e mais nada, e tinha mesmo medo que as pessoas não tivessem acesso ao céu dos cães, porque se assim fosse eu não podia ir brincar com o Ondin.
Consolava-me pensando que se no céu tudo era bom, então eu e o Ondim não podíamos estar separados por que ficaríamos tristes.
Por outro lado, havia pessoas que tinham medo de cães (uma coisa que eu achava ridícula) e portanto para elas seria mau se tivessem de partilhar o seu céu com cães.
Talvez Deus e Jesus me deixassem a mim e as outras pessoas que gostavam de cães ir ao céu deles...

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Eu tento, mas...

Hoje, a caminho da faculdade, passei por um mendigo que estava a dormir no passeio.
Não e novidade nenhuma, todos os dias vejo imensos e já não fico triste nem com pena: não sinto nada.
Mas desta vez, eu trazia comigo uma sandes, para não ter de comprar lanche na faculdade.
Hesitei um bocado, mas acabei por tirar o pão da mala e ajoelhar-me junto ao homem.
-Ei. - chamei. -Ei!
Segurei-lhe os dedos, mas ele não se mexeu. Estava gelado.
Um pouco assustada, fiquei imóvel por uns instantes, a ver se ele respirava.
Quando percebi que estava bem, coloquei-lhe a sandes na mão estendida sobre a calçada, tendo o cuidado de a prender entre os dedos dele. Depois, ergui-me e continuei o meu caminho.
Estava muito feliz comigo mesma, a pensar na surpresa do homem quando acordasse e desse com uma sandes de doce caseiro nas mãos, quando me cruzei com um outro mendigo, que, com um chapéu na mão, pedia a minha ajuda.
Eu já não tinha nada para lhe dar.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

"Quando eu era jovem e louco..."

Toda a gente me diz que esta é a melhor parte da minha vida. Será que o resto é assim tão mau?
Não quero dizer que a minha vida agora seja má... É verdade que não tenho muitas preocupações: faculdade, carta de condução, e, talvez, dentro de pouco tempo, um empregozito não são nada comparados com as chatices dos adultos... Divirto-me, sim, e às vezes posso ser um bocadinho irresponsável...
Mas sei que uma das coisas mais importantes para a minha felicidade são os meus sonhos. è lutar por eles que me faz feliz agora. É imaginar-me a concretizá-los que me dá esperanças de ser ainda mais feliz.
Hoje, na aula de Estudo de Arte Moderna, a professora repetiu que esta a melhor parte da nossa vida, e explicou-nos porquê: as pessoas iam desiludir-nos, muitos poucos de nós iam ter boas carreiras...
Depois de um longo suspiro, pensei que certamente o meu ordenado seria muito mau, o meu horário sobrecarregado e que nunca teria nem meios nem tempo para fazer as coisas de que gosto, nem para me dedicar a mim própria e às pessoas de que gosto.
Quando saímos da sala Catarina sugeriu chumbarmos o resto da nossa vida para nunca termos de fazer nada além de estudar.

"Quando eu era jovem e louco..."

Pois bem, eu sou jovem. Se a minha idade me dota de alguma loucura, vou aproveitar ao máximo a coragem que me dá a inconsciência para me dedicar a um futuro praticamente impossível.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Entre Cães

É um desafio brincar com os meus cães, porque são muitos e porque temos apenas dois brinquedos: um osso sujo e uma bola vazia (que mais parece um bocado de plástico murcho). Não vale a pena comprar mais, porque depressa se perdem ou estragam, além de que eles facilmente se entretêm com paus, pinhas (o brinquedo favorito da Sissi) e pedras (a perdição do Dosty). Aliás, nem costumam ligar muito aos brinquedos tradicionalmente de cães, mas esta tarde, quando peguei no osso e na bola e fui ao encontro deles, ficaram estáticos, com as orelhas viradas para a frente e os olhos fixos em mim - eu tinha o osso e a bola. Se o osso e a bola estivessem no chão, não quereriam saber deles, mas como eu os tinha, já todos os queriam.
Aproximaram-se num instante, o Dosty e a Mel aos saltos, o Alex a abanar o rabo com tanta força que sacudia o corpo todo, e a Nicky muito atenta.
-Vocês querem a bola? - perguntei-lhes, agitando-a no ar, enquanto eles a seguiam com os olhinhos nervosos - Querem? E o osso? - desafiei, esfregando o osso de pano imundo no nariz de cada um deles, sem deixar que o apanhassem.
Incapazes de se controlarem, Dosty e Mel saltaram para apanhar os brinquedos, e também eu tive de saltar para trás para lhes escapar.
-Pois-eu-não-vos - cantarolei, enquanto batia levemente como osso no focinho de cada um- dou. - terminei, quando Alex fechou a boca com um som seco, tentando em vão apanhar o brinquedo.
A Mel já tremia de excitação, e estavam todos tão próximos de mim que quase não me conseguia mexer, pelo que atirei a bola.
Dosty e Mel largaram a correr atrás dela a toda a velocidade, e em menos de nada Dosty agarrou-a (ele é o mais rápido de todos, e é quase sempre ele que apanha os brinquedos)e afastou-se, com a cauda no ar a abanar, todo satisfeito.
Mel correu ao meu encontro, na esperança de apanhar o osso, que os outros tinham ficado a olhar.
Afastei-me e atirei-o para cima. Com os focinhos virados para o ar, os cães viram onde o osso ia cair, alguns chocaram uns com os outros, e quando ele já estava próximo, ergueram-se nas patas traseiras.
Nicky apanhou-o, é normalmente ela quem apanha os brinquedos quando os atiro assim: é uma Grand Danois, muito maior que todos os outros, que são Goldens e Labradores Retriever.
Muito contente com o seu feito, Nicky ergueu o focinho exibindo o osso.
Mas o osso é o brinquedo favorito da Mel, e ela não ia desistir sem luta: tentou uma e outra vez tirar o osso à Nicky, que por duas vezes a fintou, mas à terceira é de vez e Mel conseguiu tirar-lhe o brinquedo.
Tristíssima por lhe terem tirado o osso, Nicky correu para mim e encostou-se com força, obrigando-me a recuar uns quantos passos para não cair sobre o seu peso, enquanto me lançava um olhar queixoso: "Olha, dona, viste o que ela fez?"
-Vá, Nicky, os brinquedos são de todos, têm que os partilhar. - disse-lhe.
Entretanto, Dosty apercebera-se de que a Mel tinha o osso.
Ora, aos olhos do Dosty, aquilo não estava certo: mesmo que ele estivesse a brincar com a bola e não com o osso, ninguém podia brincar com o osso. Ponto final.
Ultrajado, largou a bola e começou a ladrar na minha direcção: "Olha! Olha, dona! A Mel tem o osso! Não é justo, o osso é meu, não é dela, e a bola também, é minha, e de mais ninguém, portanto não quero os outros cães a brincar com eles, ouviste? Vai lá tirar-lhe o osso, dona!"
ZÁS! Enquanto o Dosty se queixava, Alex tirara-lhe num instante a bola e fugira com ela.
Quando Dosty se deu conta, olhou espantado para o outro, que corria muito feliz na minha direcção com a bola na boca.
Indignado, Dosty seguiu-o, e quando Alex se sentou à minha frente, exibindo o brinquedo como se fosse um troféu, Dosty tornou a ladrar: "Mas o que é isto!? Já viste, dona? Primeiro, brincam com o meu osso, agora tiram-me a bola e eu não tenho nenhum brinquedo e são os dois meus! Tira-lhes os brinquedos! Tira-lhes!" entretanto, o Alex abanava-se, a olhar para mim com o ar mais amoroso e vaidoso do mundo: "Olha, dona, olha para mim, estás a ver? Eu tenho um bola, estás a ver dona? Eu tenho uma bola!".
Só a Sissi, a Élis e a Nicol não se juntaram à brincadeira: A Sissi é demasiado velha, e só muito lentamente se consegue arrastar, hesitante e a coxear, para onde quer que seja; a Élis é demasiado fina para se misturar com a ralé, recusa-se a participar nestes jogos, e a Nicol limita-se a seguir-me para todo o lado, parando quando eu paro e sentando-se quando percebe que vou ficar algum tempo no mesmo sitio (ocasionalmente, pode aproveitar para me lamber as pernas).
São uma boa companhia...