domingo, 12 de fevereiro de 2012

A vergonha dos Portugueses

Sempre que conheço uma pessoa nova e lhe revelo que sou portuguesa, ela fica logo toda contente. Conta-me que tem montes de amigos portugueses, e que adora portugueses, porque os portugueses são todos alegres, divertidos, e por aí fora... Normalmente,perante todo este entusiasmo, limito-me a curvar os lábios num sorriso forçado. Mas o que me apetece mesmo é responder-lhe com num tom trocista: "Desculpa lá, mas eu vou desiludir-te!".
Sou uma pessoa bastante reservada. Salvo raríssimas excepções, não me sinto à vontade junto de desconhecidos, e só ao cabo de algum tempo consigo confiar neles. Sou, também, muito séria. Dificilmente rio e ainda mais dificilmente faço alguém rir. Isto faz de mim uma das piores companhias possíveis para uma festa. E para muitas outras coisas.
Todavia, persisto em contrariar a minha natureza anti-social: temendo morrer sozinha rodeada de cães, de vez em quando concordo em aparecer numa ou noutra festa, com o intuito de fazer amigos.
Hoje aceitei um convite para uma festa de um mexicano com quem devia ter convivido um total de vinte minutos. Quando ele me telefonou para descrever a dita festa, eu estava num ruidoso pub, e não compreendi tudo o que ele me disse. Por isso, ao sair de casa, estava convencida de que ia assistir a um concerto "mariachi" numa festa plena de convidados jovens que se desconheciam.
Em vez disso deparei-me com uma humilde festa familiar, em que os convidados tinham ou dois anos ou mais de trinta, e eram amigos de longa data. Para mim, foi como entrar na arena de um circo romano, onde variadas feras me esperavam. As pessoas faziam turnos ao redor dos fogões, preparando uma série de pratos, incluindo um português. Para desilusão geral, eu não sabia como preparar o tal prato português, pelo que não os pude ajudar. O mexicano que me convidara desafiou-me para um jogo de ping-pong. Tentei recusar amavelmente, sabendo que qualquer tentativa de participar num desporto organizado resultaria na minha humilhação. Mas ele tanto insistiu que não pude negar. Felizmente para mim, o meu adversário foi paciente e ao fim de alguns serviços estava finalmente a apanhar o jeito. Foi então que ele chamou outro rapaz (leia-se homem) para jogar comigo. Este jogava tão mal quanto eu, pelo que o ambiente tornou-se pesado e depressa o jogo terminou. Sugeri-lhe que jogássemos antes cartas. Mais por educação do que por vontade ele concordou. Não me importei: depois de experimentar o "pepe-rápido", até o jogador mais céptico se diverte a valer com um baralho de cartas.
Pela primeira vez, isso não aconteceu.
Depois de algumas vazas, já estava à espera que qualquer acaso pusesse um fim àquele jogo. As minhas preces foram ouvidas, mas da pior maneira possível: uma adorável bebé aproximou-se de mim e pediu-me para jogar. Aliviado, o meu oponente largou o seu baralho e foi para a cozinha, deixando-me a sós com a menina.
Não tenho jeito nenhum para crianças. Normalmente, graças a algum maravilhoso instinto, os miúdos evitam-me. Alguns choram só de olhar para mim. Acho que até hoje, só um bebé se tinha afeiçoado a mim. Esta foi a segunda. Insegura, concordei em jogar com ela. Basicamente, as duas púnhamos uma carta de cada vez na mesa, e, independentemente das nossas jogadas, ela ganhava e eu perdia.
Quando ela se cansou do nosso jogo, eu olhei para o relógio sobre a lareira. Nem acreditei que ainda só tinha passado uma hora.
Esperei mais um pouco, e depois, educadamente, despedi-me de toda a gente e saí. Mas, antes que eu o fizesse, um espanhol teve a simpatia de me revelar que entendia português. "Ai, é?" disse eu. "Olha, obrigadinha, agora é tarde demais, não?!" pensei eu.
Eles foram simpáticos. Sem dúvida. Um português como deve ser, daqueles que falam alto e riem com vontade e que são a alma da festa teria apreciado aquele tempinho.
Eu é que sou assim.